Transporte Rodoviário de Cargas – TRC
Conflitos Gerados por: Demanda x Qualidade x Deveres x Obrigações x Custos:
Recentemente publicamos diversos artigos tratando da necessidade e importância de maior equilíbrio da matriz de transportes dos diversos modais, com destaque às recentes concessões e privatização de ferrovias e da nova legislação para estimular a cabotagem (Br do Mar), que representam ~9% e 24% respectivamente, que entretanto irão gerar reflexo em médio e longo prazos (2 a 5 anos).
Mesmo considerando a evolução de outros modais o TRC continua sendo o mais importante e representa ~59% e em função disto vamos avaliar alguns pontos, a saber:
Demanda e Qualidade dos Serviços:
Apesar da recuperação da demanda do transporte rodoviário de cargas no período pós-covid 19, com crescimento em 2.021 de 11,4% (4,6% PIB Brasil), não voltou aos índices anteriores e cuja ocupação se mantém abaixo da capacidade instalada e tal fator interfere nos custos e na lucratividade das empresas de transportes e dos caminhoneiros autônomos, com reflexo na qualidade das operações (manutenção e reposição da frota, treinamento e qualificação, etc.).
O atual desequilíbrio entre a oferta e a demanda, com os efeitos citados acima é agravado pela entrada de novos “players” (principalmente autônomos), agora incentivados pelo programa de financiamento do governo (Renovar) com o objetivo (ou pretexto) de retirar de circulação veículos com mais de 30 anos (~910 mil de um total de 3,5 milhões), o que é bom por um lado para melhorar a segurança e diminuir a liberação de poluentes, mas por outro lado aumenta a capacidade instalada, que implica na maior dificuldade com o retorno do investimento que indiretamente aumenta os custos e redução da lucratividade, apesar do Ministério da Economia avaliar que a medida pode diminuir custos no setor e alavancar a competitividade no país, sendo que as expectativas do desempenho do setor estão relacionadas ao crescimento da economia.
O que acontece na prática:
Os embarcadores, com raras exceções, contratam transportes dando um peso para o valor do frete e deixando para segundo plano as qualificações da transportadora (valor dos serviços), praticando verdadeiros “leilões de preços” e as transportadoras, por sua vez, não conseguem mostrar o diferencial de qualidade de suas empresas de forma a valorizar seus serviços e evitar a concorrência predatória.
Para atenuar o impacto da distorção é importante que durante o processo de negociação, o embarcador, leve em consideração primeiro as qualificações da transportadora (tipos de serviços, organização da empresa, instalações (sede, filiais, oficinas, etc.), equipamentos (frota, etc.), serviços de apoio (treinamento, informática, projetos, etc.), utilização de normas e padrões, saúde financeira, etc, além de colocar à disposição seus indicadores (como nível de qualidade, pontualidade na coleta e na entrega, danos na carga, etc, índices de ocorrências (furtos, acidentes, etc.) e de satisfação (dos clientes, dos funcionários, etc.).
Deveres e Obrigações:
Estes itens estão ligados diretamente aos aspectos da legislação conhecida como a “Lei do Caminhoneiro” (no 13.103 de 2012) e alterada em 2015 com novidades sobre a jornada do motorista externo e foi criada para cuidar da saúde, bem-estar e segurança do motorista, evitando acidentes e garantindo a dignidade humana no ambiente de trabalho.
Jornada de trabalho: Existem notícias sobre condutores que ficaram mais de 2 dias dirigindo sem parar, causando acidentes e outras graves consequência e sob efeito de entorpecentes. Deve compreender 8 horas diárias, ou por acordo ou convenção coletiva, poderá ser adotada a jornada 12×36 em regime de compensação; podendo ser estendida com horas extras pormais duas horas, porém em caso de acordo coletivo ou convenção coletiva a jornada pode ser estendida em até quatro horas extras e a depender da rota percorrida, as horas extras também serão permitidas para escalas 12×36;
Pausa para refeição: o motorista tem no mínimo uma hora diária de pausa de refeição, podendo ou não ser o mesmo intervalo de parada obrigatória e se o motorista dirigir por 4 horas seguidas, é obrigatório fazer um descanso obrigatório de pelo menos 30 minutos;
A cada 24 horas de trabalho, o motorista tem direito a 11 horas de descanso que podem ser fracionadas e que o colaborador possa disfrutar de 8 horas ininterruptas de descanso. Para viagens longas que ultrapassam 24 horas o motorista pode repousar dentro do caminhão ou em um local em condições adequadas. Caso a viagem dure mais de 7 dias a empresa deve custear alojamentos, ou hotéis, para o motorista descansar um período de 24h que pode ser fracionado;
Carregamento, descarregamento, tempo de espera e fiscalização: São tempos que não fazem parte da jornada, porém se a espera exceder duas horas, pode ser considerada como descanso. As horas dos períodos de espera são indenizadas com 30% do valor da hora do profissional. Portanto, não são horas extras e nem horas trabalhadas, e não refletem no descanso semanal (DSR), no 13º salário, férias, etc.;
Repouso semanal: Pode ser fracionado em até dois períodos, no entanto, o primeiro período deve ter pelo menos trinta horas ininterruptas de descanso realizados na mesma semana. É importante que a empresa possa se atentar ao período de descanso do colaborador e ceder as horas necessárias para descanso o mais breve possível e podem ter férias fracionadas até três vezes, desde que os períodos não sejam inferiores a 14 dias seguidos;
Controle de jornada: o registro do ponto é fundamental para garantir os direitos do colaborador, no caso da categoria de motoristas profissionais, além de ser um direito, é um dever das empresas contratantes e se possível ter uma plataforma para registro de ponto e a gestão de tempo que são de competência do motorista e de seu superior;
Resumindo, os deveres e obrigações geram custos importantes, principalmente as trabalhistas.
Custos:
Custos Fixos (ratear por quilometro rodado): Depreciação, remuneração do capital, salários e encargos, licenciamento, despesas administrativas;
Custos variáveis (proporcional aos quilômetros rodados): Combustível, pneus, câmaras, lubrificação e manutenção;
Obviamente os custos são influenciados pelos tópicos acima. Como ser Competitivo:
- Para os custos fixos o objetivo será fazer com que o veículo percorra a maior quilometragem possível (para rateio dos custos fixos);
- Para os custos variáveis o importante será manter o veículo em boas condições de manutenção para otimizar os custos;
Conclusão
– Resumindo: o veículo deverá rodar o máximo possível (aproveitamento para ratear os custos fixos) e ter a melhor ocupação possível (peso e volume) e para estes dois pontos a barreira a vencer será: “lutar” contra as dificuldades da eventual falta de demanda, ter um forte controle de custos e evitar ao máximo os “leilões de preços”, a ponto de ter operações deficitárias.
Boa sorte
Antonio Carlos da Silva Rezende é engenheiro mecânico e de segurança no trabalho, qualificação em mestrado pela Escola Politécnica da Universidade São Paulo e gerente da divisão de logística do IMAM, entidade dedicada ao treinamento, publicações e consultoria.