Estamos Caminhando Para o Equilíbrio do Uso de Modais na “Matriz dos Transportes”?
Durante as duas últimas décadas foram feitos artigos e pesquisas sobre a importância do equilíbrio dos modais na “matriz de transportes” no Brasil, até que recentemente foi possível visualizar “uma luz no final do túnel” e possibilita esperar que as recentes ações comessem e se concretizar a médio prazo, 2 a 5 anos, com aumento da eficiência e redução de custos.
Quando avaliamos a utilização dos diversos modais não podemos simplificar as ações a tomar, mas avaliar a disponibilidade (ou falta) de infraestrutura e/ou equipamentos dos modais mais adequados a cada tipo de produto (valor agregado, volumes e distâncias a percorrer).
A seguir faremos um breve resumo sobre a situação dos diversos modais:
Rodoviário – Continua Sendo o Principal Modal:
Seu uso é adequado para distâncias de até 400km a 500km, porém como não há disponibilidade dos outros modais são realizadas viagens por todo o País o que implica no excesso de concentração neste modal (~60% do total), cujo custo (R$/t/km) é maior que dos outros modais;
O destaque é a disponibilidade para operações porta-a-porta, apesar dos custos e da infraestrutura deficiente (grande parte das rodovias inadequadas e parte dos veículos com idade além da razoável), tem destacada participação nas distancias menores, transferências e na chamada “última milha” (“last mail”), porém apresenta algumas inseguranças (pouco respeito ao limite regulamentar de horas trabalhadas, transportadores querendo cobrar mais e os embarcadores pagar menos, questionamentos do tabelamento, potencial de greve, roubo de cargas, etc.).
Resumindo: o transporte rodoviário será sempre muito importante para curtas e médias distâncias, devendo apenas rever os aspectos negativos citados acima.
Aquaviário (Hidroviário, Marítimo, Cabotagem) – Grande Potencial para Transportes ao Longo da Costa:
Este modal representa aproximadamente 14% do total transportado e assim como o ferroviário é bom para grandes volumes/pesos, produtos de médio e baixo valor agregado e distancias acima 400km a 500km, com economia entre ~20% a 30% no custo, apesar do maior transit-time (tempo da origem => terminais => destino, mais as esperas).
Para o hidroviário (hidrovias/rios navegáveis) o destaque é o transporte de produtos agrícolas “in natura” de baixo valor agregado e está em andamento um projeto denominado de “Arco Norte” que é a implantação de 7 terminais privados ou públicos nos rios Tapajós, Madeira e Amazonas, com objetivo receber a safra da região centro-oeste, principalmente para exportação, com significativa economia de custo e prazo devido ao percurso muito menor se comparado com o sudeste (Santos), porém dependerá das interligações rodoviárias e ferroviárias.
A implantação de uma hidrovia depende do calado (profundidade) e desnível do rio, o que poderá demandar a construção de eclusas (normalmente representam grandes investimentos).
Quando falamos de marítimo o destaque é para o transporte internacional, que depende muito da eficiência dos nossos portos (infraestrutura e burocracia alfandegária, fiscalização e vigilância sanitária) que é razoável quando comparado com os demais modais e depende de algumas melhorias.
A cabotagem (transporte marítimo na costa) representa ~11% da matriz. O Brasil tem ~8.000km de costa que deveria ser melhor aproveitado, porém depende de transbordo dos polos industriais que estão a até ~300km da costa) com potencial economia de custo, entre 20% a 30%.
O destaque é para o transporte de petroquímicos, produtos agrícolas e industriais, que atualmente em grande parte vão de caminhão e poderiam ser transportados a granel ou por contêiner.
Pontos negativos: baixo volume de cargas (o armador reclama que não tem carga e o embarcador que não tem navio) e muitas escalas intermediárias, o custo é sensivelmente menor, porém tem maior transit-time o que leva o embarcador a optar pelo TRC.
A novidade é projeto de lei 4199/2020, conhecido como “BR do MAR” que tem como objetivo aumentar a oferta da cabotagem e principalmente reduzir custos, prevendo ampliar o volume de contêineres, de 1,2 milhão de TEU´s em 2019, para 2 milhões de TEU´s, em 2022 (+66%), podendo melhorar o equilíbrio da matriz de transporte. O programa foca em 4 eixos: Aumentar Disponibilidade da Frota: estimular que Empresas Brasileiras de Navegação (EBN`s) possam realizar afretamentos a tempo (navio é afretado com a bandeira estrangeira, para diminuir custos operacionais) para substituir embarcações que estiverem em reparo, ou construção; Indústria Naval: fomentar o segmento de manutenção e reparos em estaleiros brasileiros, que hoje utilizam estaleiros estrangeiros; Custos: ações para viabilizar o aumento da competitividade da cabotagem, reduzindo burocracias que sobrecarregam as operações; Portos: permissão do uso de contratos temporários para movimentação de cargas e agilizando a operação de terminais dedicados à cabotagem;
Em 16/ 12/ 2021 a câmara concluiu a aprovação “BR do MAR”, cujo texto seguiu para sanção.
Recomendações relativas à Cabotagem: Em função do exposto as empresas que já tentaram operar com este modal sem sucesso, principalmente devido à baixa frequência (espera no porto), e grande “transit-time”, devem ficar atentas às mudanças que deverão ocorrem em 1 a 3 anos.
Ferroviário – Bom Potencial para Produtos: 1º) De Baixo Valor e Grandes Distâncias e 2º) Médio Valor:
Em primeiro lugar devemos destacar que os autodenominados “especialistas” que clamam pelo aumento do transporte ferroviário deveriam entender que, sim seria importante a ampliação, porém devem ser avaliadas algumas restrições que serão relacionadas a seguir:
Atualmente representa aproximadamente 20% a 25% do total transportado e assim como o marítimo é bom para grandes volumes/pesos, produtos de médio e baixo valor agregado e distancias acima 400km a 500km, com economia entre ~20% a 30% no custo, apesar do maior transit-time (tempo da origem => terminais => destino, mais as esperas).
Na década de 1990, devido a dificuldades econômicas foi iniciado o processo de concessões, que só previam melhorias na infraestrutura (dormentes, trilhos, sinalização, etc.) e novo material rodante, para reduzir o número de acidentes e aumentar a ocupação/rentabilidade dos ativos, porém não previa a ampliação da malha, o que tem sido contemplado mais recentemente com as parcerias público-privadas (PPI).
Apesar de ser muito bom/competitivo para produtos de médio e baixo valor agregado, será importante o aumentado do uso para contêineres, o que caracteriza o transporte de produtos de médio/alto valor agregado.
Está prevista a privatização (não confundir com concessão) de diversos novos trechos (~R$13 bilhões), com destaque para a interligação das ferrovias “centro-Oeste” com a “Norte-Sul” para facilitar o escoamento da produção agrícola para o “Arco Norte”, com vistas a exportação.
Recomendações Relativas ao Transporte Ferroviário: Em função do exposto as empresas que já tentaram operar com este modal sem sucesso, principalmente devido à baixa disponibilidade (infraestrutura deficiente que dificulta a velocidade e falta de equipamentos rodantes), devem ficar atentas às mudanças que deverão ocorrem em 2 a 5 anos.
Os demais modais:
O transporte aeroviário de cargas interno representa menos que 1% e com custo bem maior, entretanto muito bom para itens de alto valor agregado, pequeno porte/peso, perecíveis e urgentes
E o dutoviário representa ~3% a 4% (petróleo, combustíveis, gás, etc) e depende de projetos específicos e grandes investimentos, porém com custo operacional extremamente competitivo.
O que podemos concluir:
Reiterando o que comentamos acima existe uma perspectiva de melhoria a médio e longo prazos, (2 a 5 anos) pois além das ações da iniciativa privada o ministério da infraestrutura entendeu o problema da logística e está tomando medidas para melhorias, algumas no próprio ministério ou enviando projetos de lei (PL´s) para o congresso (nota: favor considerar que esta é uma interpretação técnica do autor, sem nem um viés político).
Autor: Antonio Carlos da Silva Rezende é engenheiro mecânico e de segurança no trabalho pela FEI, extensão pela FGV, qualificação em mestrado pela Escola Politécnica da Universidade São Paulo e gerente da divisão de logística do IMAM, entidade dedicada ao treinamento, publicações e consultoria. antonio.rezende@imam.com.br