Inteligência na Construção de CDs
Os edifícios consomem 18% de toda a energia produzida no Brasil e 21% da água distribuída no País. Sem contar que a construção ou a reforma desses edifícios, sejam eles armazéns, residências, prédios corporativos ou fábricas, utiliza 75% dos recursos naturais extraídos do meio ambiente e gera 80 toneladas de entulho por ano, cerca de 450 kg de lixo por habitante. Com esses dados, fornecidos pelo CBCS (Conselho Brasileiro de Construção Sustentável), é impossível negar os efeitos nocivos que as construções, incluindo os armazéns, acarretam à sociedade e ao meio ambiente.
Para evitar esses impactos, as empresas estão repensando a construção de prédios e incluindo projetos que racionam o consumo de energia e água, respeitam o meio ambiente e contribuem para o desenvolvimento local. Segundo o Green Building Council Brasil, instituição norteamericana responsável pela certificação LEED (“Leadership in Energy and Environmental Design”, liderança em energia e arquitetura ambiental), o Brasil tinha quatro edifícios certificados em 2005. No entanto, os centros de distribuição ainda parecem tímidos em relação a essa iniciativa. Antigamente só o CD da Bomi Farma, em Itapevi, região metropolitana de São Paulo, ostenta a certificação LEED e o condomínio logístico da GR Properties, o GR Jundiaí. Mesmo assim ainda é muito pouco para o montante de armazéns em operação no País. A certificação Aqua (Alta Qualidade Ambiental), a primeira iniciativa brasileira nesse setor, coordenada pela Fundação Vanzolini, da Universidade de São Paulo.
Um dos motivos que ainda inibem as empresas a certificarem seus edifícios é a burocracia que o processo exige, como o envio de relatórios às certificadoras, explicando cada etapa da construção. Por outro lado, essa burocracia é o que garante a eficiência da obra e contribui para a adequação do projeto. A GR Properties procurou uma empresa especializada em auxiliar edifícios a obter o LEED e não se arrepende, pelo contrário, os próximos empreendimentos, como o GR Campinas, seguirão o mesmo padrão de sustentabilidade.
A certificação não pode servir de barreira para a construção de edifícios sustentáveis. O Grupo Fiat inaugurou recentemente seu primeiro centro de distribuição de peças da CNH (Case New Holland) seguindo medidas de “green building” (construção verde), com tratamento de água de esgoto, redução do consumo de energia e melhoria do ambiente de trabalho. Não certificou seus edifícios, mas criou metas próprias para redução dos impactos socioambientais, tornando a operação sustentável.
Escolha do terreno
O primeiro passo para a construção de prédios eficientes é a escolha do terreno que abrigará o projeto. Isso inclui a localização, o tipo de vegetação, o relevo, entre outros itens. No caso da localização, por exemplo, é fundamental que o centro de distribuição ou qualquer empreendimento empresarial que necessite de mão de obra procure locais de fácil acesso, que permitam (e incentivem) a implementação de transportes alternativos, como bicicleta, ônibus fretado, transporte público (metrô, trem, ônibus), etc. O objetivo é fazer com que o deslocamento dos profissionais de casa até o trabalho não se torne um grande emissor de CO2 ou cause trânsito nas principais vias da cidade. Imagine o impacto que 150 funcionários, movimentando-se do trabalho para casa, cada um em seu carro e ao mesmo tempo, traria para uma cidade pequena. Com certeza, afetaria a rotina e o ar do município.
Materiais e fornecedores
Tanto a certificação LEED quanto a Aqua acreditam que a escolha de materiais usados na construção do empreendimento é fundamental para a definição sustentável do edifício. Atualmente, o mercado já oferece itens reciclados ou ecologicamente corretos, como bloco de concreto de areia de fundição, cimento ecológico, conduite e encanamento de material reciclado (garrafas pet). A escolha desses materiais não é simples modismo, envolve a redução do consumo de recursos naturais e das emissões de gases de efeito estufa. No cimento, por exemplo, o principal componente, o clínquer, produz CO2. Segundo a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), o clínquer contribui para que a indústria de cimento responda por 5% das emissões de dióxido de carbono. A solução está no CPIII, cimento que substitui o clínquer por escórias siderúrgicas, ou seja, por sobras da fusão de minério de ferro, coque e calcário. Votorantim, Holcim, Camargo Corrêa, entre outras, já fabricam a versão menos agressiva do cimento. O aço é outro material muito utilizado na construção de centros de distribuição que, se escolhido corretamente, pode contribuir para a diminuição do consumo de recursos naturais.
Já os fornecedores de materiais de construção devem apresentar relatórios e certificações que garantem a adoção de normas socioambientais em todas as etapas de produção e distribuição de seus produtos. Essas empresas também precisam estar instaladas na mesma localidade (cidade ou região metropolitana) da obra. Os objetivos são reduzir a emissão de CO2 com o transporte de materiais e fomentar o mercado local.
Canteiro de obra
As etapas de construção do CD não podem agredir o meio ambiente. Para isso, deve-se avaliar as características ambientais do terreno, que incluem o tipo de vegetação, a composição do solo e os impactos que a instalação do CD proporcionará. No caso da GR Properties, a empresa retirou a primeira camada do solo – considerada fértil – construiu o CD e alocou a mesma terra nos 15 mil m² de paisagismo.
Segundo Frederik Purper, consultor de sustentabilidade da CTE (Centro de Tecnologia de Edificações), que prestou consultoria ao projeto GR Jundiaí, é preciso elaborar um plano de prevenção e controle de poluição ambiental do canteiro de obras. “É necessário descrever a forma de gestão e as estratégias a serem implementadas na obra, pensando em minimizar os impactos ambientais, como geração de poeira, erosão do solo, poluição do ar, alteração do tráfego local, entre outros pontos.”
Esse controle exige a instalação de equipamentos e estruturas capazes de reduzir os efeitos negativos da obra. Para diminuir a liberação de poeira, por exemplo, Frederik explica que é necessário instalar um lava-rodas, destinado à limpeza dos pneus dos caminhões que circulam no canteiro. O sistema, instalado sobre um piso de brita ou concreto, é composto por calhas para escoar a água suja e caixas coletoras, que filtram essa água e depois a encaminham para a rede pública de coleta. Já para evitar a erosão e a contaminação do solo, deve-se instalar barreiras formadas por camadas de manta e brita, que retêm os resíduos sólidos.
Soluções e equipamentos
Para operar de forma sustentável, o CD precisa estar equipado com soluções que o tornem eficiente e menos dependente de abastecimento de água e recursos energéticos. O projeto deve estudar todas as possibilidades, casando informações sobre as necessidades do modelo de operação, o perfil da empresa, o valor a ser investido, o histórico de temperatura e chuvas da região. E a partir dessas informações é possível definir o tipo de telhado, se é interessante estocar água da chuva, tratar os resíduos líquidos, implementar sistema de captação de energia solar, adquirir lâmpadas halógenas, instalar sistemas eficientes de refrigeração, etc. O novo centro de distribuição da CNH, em Sorocaba, interior de São Paulo, optou por implementar o sistema de coleta de água de chuva e o de tratamento de resíduos líquidos, reduzindo o consumo de água nos sanitários e no jardim.
CD sustentável reduz
em até 25% o consumo
de água e energia elétrica
Já o condomínio da GR Properties, em Jundiaí, avaliou o histórico pluviométrico da cidade, o tamanho do telhado do edifício (40 mil m²) e identificou que o alto índice de chuvas e o enorme potencial de coleta dos galpões inviabilizavam a instalação de um sistema de estoque pluvial, optando apenas pelo sistema de tratamento de resíduos que purifica todo o esgoto do condomínio, direcionando a água tratada para a irrigação. O telhado do condomínio também foi projetado para facilitar a entrada de luz natural e propiciar conforto térmico por meio de um sistema de renovação de ar, no qual o ar frio empurra o ar quente, eliminando-o do ambiente.
De olho no futuro
A GR Properties não idealizou um condomínio logístico com cerca de 40 mil m², 21 módulos flexíveis e certificação green building só para dar credibilidade à marca. O GR Jundiaí nasceu de olho nas possibilidades e restrições que o futuro reserva. A diretoria da empresa percebeu que os consumidores estão tomando consciência da importância de adquirir produtos provenientes de empresas sustentáveis e começam a exigir um posicionamento de suas marcas favoritas. Isso tem preocupado toda a cadeia, pois se as legislações se tornarem mais rígidas (e se tornarão) e os clientes mais exigentes, não haverá espaço para condomínios logísticos, galpões, armazéns ou CDs que não seguem normas sustentáveis. Esses, sem dúvida, ficarão ociosos, e é exatamente o que a GR quer evitar. E o que as empresas também deveriam evitar.
É mais caro uma obra sustentável e um edifício eficiente, sim, entre 1% e 5%, segundo Frederik, da CTE, mas proporcionam importantes reduções de custos, principalmente com energia elétrica e água. A GR, acredita que a despesa da operação caia em até 25% se comparada a um condomínio comum. Isso é crescimento sustentável.
* Reinaldo A. Moura: Criador e Fundador do Grupo IMAM em 1979 (Instituto IMAM, IMAM Editora e IMAM Consultoria) e Diretor Técnico das Missões de Estudo ao Japão. 50 anos de experiência profissional, em mais de 100 empresas. Pioneiro na introdução conceitos no Brasil, tais como: MAM, Intralogística, Kanban, Housekeeping/5S, TPS/JIT/Lean/Toc – Treinamento e Assessoria. Publisher da Revista LOGÍSTICA desde 1980 (300 edições). Formado em Engenharia Industrial (FEI), em Engenharia de Segurança do Trabalho (FEI) e mestrado em Engenharia de Produção (Poli-USP). Ex-professor universitário: FEI, UMC, Mackenzie, Mauá etc.